segunda-feira, junho 13, 2005

Completo escrito na areia...


Algumas notas, sobre a V Conferência Meios Alternativos de Resolução de Litígios da DGAE (i) que, confesso que a uma primeira vista me parecia, erradamente, um bocado fora da nossa paróquia, e, outras notas sobre a dita cuja paróquia propriamente dita:

1) Ajudou à clarificação do relacionamento da Ordem dos Advogados (OA) com os Julgados de Paz (JP) e os Mediadores, sendo perceptível das palavras de antigos e actuais responsáveis da OA, que um “mal-entendido comunicacional” atribuiu aos Mediadores “um pecado original”, sobre o acesso do advogado às sessões de Mediação, que só ao Legislador pode ser imputado.

Muito importante ainda, foi ouvir o compromisso público da OA de se empenhar, a custas próprias, numa campanha de informação sobre os Julgados de Paz junto de todos os Srs. Advogados, por demissão do governo de tal trabalho (já voltaremos mais abaixo a este tema).

Importa lembrar que, aquando da publicação da Portaria que regula o Serviço de Mediação dos JP, teve lugar a 1ª reunião de trabalho entre juízes e mediadores, sobre esse tema preciso, e em que as duas partes estavam inicialmente muito nervosas: ambas sabiam que não iam cumprir aquela disposição da Portaria. Nunca.

Para além disso, quando os Mediadores de Conflitos, ainda numa fase pré-AMC, elaboraram o seu Relatório sobre os primeiros sete meses de período experimental dos JP em Setembro de 2002 (ii) publicamente disseram e fundamentaram a sua recusa (bom, a nossa fundamentação última só a meio de 2003 a “conseguimos” escrever: é o Código de Ética e Deontologia dos Mediadores de Conflitos).

Como um assunto de tal gravidade pode estar ainda hoje sem emenda, arranjando confusão para a Frente e para Trás dos Montes, passados 3 anos, na legislação, dita, em vigor, não é compreensível nem aceitável.

2) A excelente intervenção da Dra. Carlota Pizarro de Almeida sobre a Mediação Vítima-Agressor, com uma clareza e um conhecimento profundo das técnicas e dos pequenos, mas importantes, simbolismos da Mediação Vítima-Agressor, só foi novidade para quem ainda não a tivesse escutado anteriormente, nomeadamente no Colóquio na FDUP a 29 de Junho de 2004, sobre a Introdução da Mediação Vítima-Agressor no Ordenamento Jurídico Português (com vista a cumprir-se a Lei-Quadro da União Europeia sobre a matéria, que a exige a partir de Março de 2006).

3) O privilégio de ouvir um Homem Sábio, o Presidente Joaquim Chissano.

4) Graças à Conferência, saber que os Nossos Valores Éticos e Deontológicos e um retrato do que Somos e Fazemos, já cruzaram as 4 partidas do mundo pelos caminhos da Lusofonia e que podemos dar um contributo para que também nas matérias de Resolução Alternativa de Conflitos (RAC) a Língua Portuguesa seja uma língua mundialmente falada e aceite nos fóruns internacionais é algo de simultaneamente reconfortante e estimulante.

5) Sistema Judicial e Meios Alternativos (ou Complementares) de Resolução de Conflitos.

O Julgado de Paz está inscrito na ordem constitucional portuguesa como um Órgão de Soberania, um Tribunal no caso.

É o Tribunal Especializado da Cidadania, e, para esse objectivo melhor alcançar, incorpora nos seus procedimentos os contributos que a Mediação e a Conciliação de Conflitos podem dar.

É o local por excelência de uma Justiça com Rosto, em que o Cidadão, aconselhado pelo seu Advogado e auxiliado por um profissional em comunicação, independente e qualificado, o Mediador, reconhece a Outro Cidadão o Direito a ser Escutado sobre o caso que os opõe e a sobre ele e em conjunto, livremente acordarem... ou não.

E, através dessa Escuta, fazer ressaltar o saldo humano e distintivo da Mediação de Conflitos: RESPEITO, RECONHECIMENTO E RESPONSABILIDADE perante o Outro.

Hoje em dia, numa Sociedade cada vez mais DesPersonalizada e Globalizada em que A NECESSIDADE DE SER ESCUTADO E RESPEITADO É IMENSA... E NINGUÉM A ATENDE, é exactamente através destas práticas, eminentemente DEMOCRÁTICAS (iii), que os Portugueses se podem reconciliar com a Justiça, pois asseguram aos Cidadãos QUE ELES AFINAL CONTAM.

Como é possível admitir, que ainda hoje em Direito da Família, se continua a restringir a intervenção da Mediação a determinadas situações litigiosas, em vez de SER UM DIREITO de quem está em conflito, mesmo na sua própria família, A PEDIR APOIO E A SER APOIADO na sua resolução mesmo para além dos aspectos litigiosos do mesmo.

Já alguém pensou NO MAL que se faz, ao deixar pessoas abandonadas no seu conflito, que por ser eminentemente emocional, provoca elevados custos sociais e ECONÓMICOS para a Sociedade com as gravíssimas rupturas que a esse nível se passam TODOS OS DIAS nas nossas empresas e comunidades em que esses CIDADÃOS em conflito estão inseridos?

Porque não se prevê no resto do Sistema Judicial, a exemplo do que já se passa nos JP, a intervenção de Mediadores de Conflitos devidamente capacitados, sempre que uma das partes, um Juiz, um Procurador ou um assistente no processo (nomeadamente organizações de apoio à vítima ou a OA), achem que há vantagem nisso e as partes, livremente, aceitem a iniciativa, poupando-se tempo e incidentes processuais a todos os envolvidos, reservando-se o tribunal para apreciar a homologação do eventual acordo, ou a continuar o processo em caso de não-acordo, sem grande perda de tempo, dada a agilidade que a Mediação tem?

O ponto é que a Mediação de Conflitos PODE AJUDAR!

6) O Sr. Secretário de Estado da Justiça (SEJ) anunciou a abertura até ao fim do ano de 4 JP, a saber, Trofa, Vila da Feira, Coimbra e Sintra, e que a partir de agora só critérios científicos comandariam a abertura de novos JP através de estudos conduzidos por peritos do ISCTE e da Dinâmia.

4 JP em 2005 significam NA PRATICA que os JP continuam DEBAIXO DO ANÁTEMA DO PERÍODO EXPERIMENTAL!

É completamente ABERRANTE que a imensa Mancha Metropolitana de Lisboa / Setúbal tenha só 2 JP (3 no fim do ano) quando é exactamente a de maior densidade demográfica e de conflitualidade crescente, para além de Mediadores capacitados.

Ou que não haja JP a sul do Seixal.

Não sendo muito conhecida a experiência em Mediação de Conflitos, dos peritos das entidades referidas pelo Sr. SEJ e se eles sabem “ver” a diferença de CIDADANIA que existe entre um acordo em sede de Mediação e outro em sede de Julgamento, gostaríamos de deixar um indicador, precioso, para a detectar:

Os olhos desses peritos brilham como os da Dra. Carlota Pizarro de Almeida quando ela fala em Mediação de Conflitos?...

Bom, é que se não brilham, estamos conversados sobre o que daí virá.

MAIS PREOCUPANTE ainda, foi o silêncio ensurdecedor do Sr. SEJ, sobre a necessidade imperiosa do Estado assumir o seu papel divulgador dos JP e de uma Cultura de Resolução Alternativa de Conflitos para Sociedade Portuguesa.

A alteração de paradigma cultural de trabalhar a RESPONSABILIZAÇÃO em vez da PUNIÇÃO que nada cria... para ninguém... é uma tarefa gigantesca que não pode continuar a estar unicamente sobre os ombros de alguns Juízes e Mediadores esforçados e meio falidos (e responsáveis da OA).

Portanto a pergunta: Há verba para Divulgação?

O Sr. SEJ de 2002 tinha-a...

7) Por último (acho...) uma pequena / GRANDE questão que, conhecida, mas mais uma vez, nunca resolvida nestes 3 anos, tem provocado a escassez de Mediações: o prazo que é dado ao demandado para responder à notificação do tribunal para vir à Pré-Mediação.

Feito a pensar no tempo que ainda havia vizinhos que recolhiam o correio ou em que só um dos membros de um casal trabalhava, NÃO ASSEGURA ao demandado o conhecimento atempado da data em que tem que comparecer no Tribunal, por um motivo que às vezes ele nem sabe que existe.

Resultado: não aparece e segue para julgamento.

Será que é desta que se vai fazer alguma coisa sobre isto?

Ou vai-se continuar a prejudicar os LEGÍTIMOS DIREITOS DO DEMANDADO?

Até à próxima ida a la playa.

Vasco Clímaco

(i)

Fórum Telecom 2 e 3 de Junho de 2005.

A propósito, para quando a mudança de designação para uma bem mais feliz “Convenção sobre Meios de Resolução Alternativos de Conflitos”, assumindo mais vincadamente o carácter preventivo e pré (ou sem) litígio que esta encerra e a outra descura... mas o Cidadão precisa?

Uma reformulação mais concreta e definida, do parágrafo anterior seria:

Continuará a Administração de Justiça neste País a “fugir a sete pés” da Mediação Extra-Competência Jurisdicional nos Julgados de Paz ou ASSUME DE VEZ que é exactamente nessa vertente que os Julgados de Paz mais se ENOBRECEM, NO SEU DEVER ÚLTIMO DE AUXÍLIO AO CIDADÃO NO SEU CONFLITO?

(ii)

In: “Julgados de Paz, Sete Meses de Período Experimental,

A Perspectiva dos Mediadores de Conflitos”, Setembro 2002,

ver Cap. X : “O Papel do Advogado na Mediação”.

Pode ser consultado em:

http://www.mediadoresdeconflitos.pt/

fazer “click” em “AMC”,

novo “click” em “Relatório da Experiência dos Julgados de Paz”.

(iii)

Presidente Joaquim Chissano:

“O 1º meio de resolução de conflitos é a DEMOCRACIA”.

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